Filme



Ando de bicicleta como quem assiste um filme sem controle remoto nas mãos. Não dá tempo de voltar. Não consigo parar para ir ao banheiro. Entro nas ruas que me agradam, e também naquelas onde algo me dá náuseas. Corro a cidade na contramão, desviando de outros como eu, de pessoas andando lentas, crianças e bolas.

De vez em quando brinco de pilotar e rasgo o chão. Finjo que tenho dez anos e que aquelas três ruas são o que falta para eu chegar onde começa o arco-íris e onde moram os gnomos. Corro a roleta russa das esquinas: aqui no fim do mundo não existem outros carros, só eu.

Quase atropelo um velho. Ele mal se importa. Vejo as filas no hospital, coitados. Acelero. Vendedores à toa cuidam das portas e da minha vida. Pisco brincando. Ninguém me vê.

Entreabertos, vejo os bares e putas deitadas nas mesas de sinuca. Uma delas quase dorme. A outra, me olha e lembra que gostava de andar de bicicleta com aquele filho da puta do seu pai.

A areia me escorrega, derrapo. Mas continuo correndo e sentindo a cidade que corre em mim.

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