Fantasias de amor e relacionamento


Eu falava de amor num sábado à noite, e chegamos de alguma forma ao filósofo e ex-candidato à presidência da Eslovênia, Slavoj Zizek. Segundo meu amigo, este autor me ajudaria muito a compreender Lacan e sua visão sobre o relacionamento.

E por que chegamos a Lacan? Porque eu disse a ele que sentia muita falta de me envolver mais com as pessoas, ou seja, de amá-las, de me relacionar de forma mais profunda com alguém. Ele riu, dizendo que desejar amar alguém era impossível, já que o amor por um outro está totalmente fora do meu controle e desejo.

Isso porque o que nos atrai vertiginosamente em direção a alguém é justamente algo que não consigo compreender, é o mistério e desconhecimento abissal do Outro.

Então seria algo no Outro que não compreendo que me atrai em sua direção? Falando de Lacan, Zizet explica que o Outro não é meu espelho, minha cara metade, um igual a mim; o Outro é um mistério sem solução.

O amor ao qual estou me referindo é como chamamos o desejo irrefreável de estar próximo, de consumir o outro , misturar-mo-nos com ele, ser parte dele. É o mito da cara metade perdida pelo mundo, é o desejo imenso de penetrar o outro, de compreendê-lo profundamente.

Nosso desejo de amor é o desejo de sermos o próprio Outro para, nos fundindo à ele, nos sentirmos amparados ou preenchidos em nosso vazio de existência. Sendo este vazio inerente à estrutura humana, como lidamos então com a sensação de abismo entre nós e o Outro?

Segundo Zizet, no texto que li, a fantasia teria o papel de nos aliviar diante da violência do Real, que eu não posso suportar. A fantasia seria uma fórmula que usamos para mediar nosso encontro violento com o desconhecimento que temos do Outro. A pessoa que amo não é uma pessoa em si para mim: ela é a visão dos meus desejos. Minha história com alguém é na verdade a história que eu mesma inventar.

A pergunta que nos fazemos para entender quais são nossas fantasias sobre o Outro é "O que eu quero?". E eis uma resposta possível: quero um relacionamento com uma pessoa bem educada, suave, que me respeite, com a qual eu consiga conversar, e que não dê tanto valor ao dinheiro, que goste de arte, que trabalhe regularmente, que tenha família e que não tenha filhos.

E assim, achando que sabemos o que queremos, não percebemos que o que queremos reflete na verdade desejos que não são meus. Meus desejos são aquilo que esperam de mim, são os papéis que são esperados que eu desempenhe.

E, realizando aquilo que acho que desejo, me torno enfim objeto de amor de todos que quero bem (pais, amigos, pessoas importantes) e que criaram papéis para eu desempenhar. Minhas fantasias servem para mediar meu encontro com o Outro, mas elas também dizem o que sou para os outros.

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Complicou? Desculpe, é sábado à noite, eu sei.

1 comentários:

Anônimo disse...

Texto interessante. É a tal dúvida eterna. Concordo com os filósofos que falam dessa projeção que os outros fazem, tudo aquilo que esperam de nós, e por incrível que pareça, a maioria das pessoas acaba seguindo essa padrão em suas escolhas. Muitos ficam felizes, se encontram, enfim, mas tem sempre os questionadores e os céticos...rs, aí complica.
Valeu pela visita lá no blog. Bj!
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