A culpa é toda sua



Outro dia li que não existem blogueiros: existem escritores. Os escritores somente habitam o espaço virtual. Pensei: sendo blogueira, devo ser uma escritora. Posso ser ruim, mas é o que faço aqui. É esquisito falar "escritora". A gente acha que é preciso ser lido, publicado, para ser digno de ser chamado assim. Culpa de ser.

Ainda ontem defendi que não é possível escrever ficção. Pelo menos eu, não consigo.

Eu sempre achei que era preciso viver para contar. Tenho travas que duram meses, como esta que descrevi aí embaixo, por deixar de viver. Então precisei sentir muita culpa hoje, para escrever aqui.

Explico: não é só a falta de tempo para si que nos tolhe a capacidade de viver, mas também e, principamente, a culpa. A culpa de não ser perfeita, de não ter a vida segundo a expectativa daqueles que somos ensinados a amar e respeitar.

A culpa por ter tempo livre e resolver ler ou dormir, por rejeitar pensar parecido com a própria família e assim ficar longe nos almoços de domingo. Por não ter sonhos de casamento, por querer ficar sozinha em casa algumas noites de sábado. A culpa por gostar do silêncio da casa, por não gostar de bordar, por não assistir TV, por não gostar de bichos fofos nem de salto alto. Culpada por fumar, por não fumar.

Sinto culpa por gostar de ler, por saber ler, por escrever. Culpa por muitas vezes não ter vontade conversar. Por receber amor e não saber retribuir. Culpa de querer sempre ir embora, fugindo da culpa de ficar.

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Blog recomendado: Literatura Nômade

Leia um trecho:

Você sonha em constituir um casamento heterossexual bem sucedido e levar seus filhos para passear no shopping? Você acha que pode conseguir manter-se num emprego medíocre para pagar vinte anos de prestação de um apê, depois aposentar-se e jogar dominó com outros aposentados na orla de alguna playa? Sente alivio quando entra no orkut e vê mais de duas mil pessoas fazendo parte de uma comunidade de Jovens Conservadores de Extrema Direita que não apoiam coisas consideradas “normais” hoje em dia? Você lê Veja e se considera uma pessoa bem informada? Você duvida que alguém pode dar um tiro na sua cara?

Recomendações: evite namorar psicopatas. Evite mandar assassinar terapeutas. Evite suicidar-se nos trilhos do metro. Não confunda cocaína com kundaline. Não compartilhe seringas. Não trepe sem camisinha. Conserve seu medo*5 Incentive a coleta seletiva de lixo. Não rasgue cartas com juras de amor. Tenha uma dieta balanceada e compre iogurte especial para conseguir cagar religiosamente no mesmo horário todas as manhas. Seja socialmente (in)útil. Vire o canudo. Dirija bẼbado mas não esqueça de andar com o suborno do policial. Não dê esmolas, faça doações a entidades de sua confiança e que já tenham experiência em administrar o caixa 2. Procure no google fotos das flores que nasceram no rio Tietê. Respire. Sinta o ar entrando suavemente pelos pulmões. Sinta uma energia de cor púrpura regenerando cada célula do seu corpo. Acredite na diversidade como base para a construção de uma cultura de paz. Redes de supermercados e lojas de (in) conveniências são iguais em qualquer não-lugar*6 do mundo. Abra os olhos e, antes de tentar acordar sonâmbulos e romper cortinas de silêncio, compre uma máscara de oxigênio.

1 comentários:

Rachel Souza disse...

Procuro não tê-la. Tem funcionado, a cuca continua razoável.rs

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